Histórias dos Trabalhadores Técnicos da Fiocruz

Manguinhos de Muitas Memórias

Ousadia, companheirismo e emancipação

Momentos de companheirismo, solidariedade e ajuda mútua dentro do Instituto nos mostram algumas das formas de (re)existência que esses trabalhadores construíram em seus cotidianos. Protagonizando suas próprias histórias, souberam atuar nas brechas e frestas de uma rígida hierarquia institucional onde o cientista se fazia soberano. Além de técnicos de laboratório envolvidos com todas as atividades do Instituto, eram também artistas, atletas, músicos, fotógrafos, militantes…

O inconformismo e a discordância com as relações de trabalho que os subalternizavam levaram os auxiliares a criar entre si cumplicidades, códigos e simbolismos que se manifestavam em pequenos atos de transgressão das regras institucionais. Ainda que escondidos dos olhares de seus superiores, sempre atuaram para produzir sua própria autonomia. A astúcia, sabedoria, ironia, colaboração e solidariedade caracterizaram igualmente seus modos de vida. 

João Simões Paulo, junto às estantes da biblioteca. Assuerus Overmeer sentado na cabeceira da mesa. Acervo Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz.Sem data. Autor: J.Pinto.

Como é possível observar no módulo Trabalho, ao ingressarem em Manguinhos, os auxiliares nem sempre iam direto para os laboratórios. Era costume que fossem designados para trabalhar nas diversas oficinas que compunham as seções auxiliares (biblioteca, museu, desenho, fotografia e microfotografia, tipografia, esterilização e preparo de meios de cultura, distribuição de soros e vacinas, biotérios e cavalariças, mecânica e eletricidade, carpintaria, conservação de imóveis e estradas, oficinas de encadernação, de preparação de ampolas e de aparelhos de vidro). A escolha para o trabalho no laboratório era uma prerrogativa dos cientistas. Daí as relações terem um caráter tão pessoalizado, uma vez que ainda não existiam leis trabalhistas no país.

 

João Simões Paulo, ou “João o Grande” como era conhecido, começou no Instituto como ajudante nas obras do edifício do Castelo e mais tarde foi aproveitado para trabalhar na biblioteca. Em suas funções de limpeza e  arrumação dos livros, arquivamento e controle das fichas de empréstimo, ajudava secretamente aqueles colegas que queriam acessar os livros, uma vez que este era um espaço de uso exclusivo dos médicos e cientistas.

 

O Assuerus era o bibliotecário [...]. E ele tinha, dois bibliotecários auxiliares e um encarregado da limpeza, que é o chamado, João, o grande, João Simões. Foi operário da construção do prédio! [...] Tomava conta, espanava, limpava, [...]. Aquilo era uma beleza de limpeza, [...] E cuidava, era o indivíduo que vinha trazer livro, levava ficha, etc. Fazia serviço de comunicação. João Simões Paulo. Olympio elogia ele como auxiliar. Não sei se vocês já leram aquele... Aquele livro do Olympio, fala em João, o grande (Attilio Borriello, 1986. Acervo COC/Fiocruz. Fita 5, lado B).

Jerônimo Cardoso era o auxiliar responsável pelo Museu de Anatomia Patológica que ficava no terceiro andar do Castelo. Ali se preservava a coleção anatomopatológica do Instituto, com peças anatômicas raras e insubstituíveis. Cardoso, considerado como exímio anatomista, cuidava da manutenção do acervo e guarda dos objetos.

Para os auxiliares que moravam em Manguinhos, o Museu era também um local de lazer e aprendizado. Nos horários de folga, geralmente no fim de semana, visitavam o museu e se admiravam das peças anatômicas lá expostas. Um objeto inusitado chamava a atenção: a perna do aviador italiano Carlo Del Prete.

[...] no terceiro andar tinha um museu, [...] aonde eu ia me distrair. [...] o encarregado do museu era o Jerônimo Cardoso. [...] É quem montava aquelas peças, aquela coisa toda. Com aqueles vidrinhos [...] Era um museu muito bem montado. E nós mantínhamos lá, uma peça que não era, não era de interesse científico, mas ninguém procurou, ficou aí dezena de anos, foi a perna do Del Prete. Aquele aviador italiano, que num vôo aqui no Rio de Janeiro, sofreu um acidente e amputaram a perna dele.[...] Tinha, tinha, num frasco com formol. Montada pelo Cardoso. Um líquido muito claro, aquela perna atlética. Tinha um rim, que me chamava a atenção, de uma autópsia feita no São Francisco de Assis, tiraram três quilos e meio de areia e pedra. (Attilio Borriello, 1986. Acervo COC/Fiocruz. Fita 5, lado A)

Havia uma rede de apoios bem estabelecida. O módulo Educação detalha aprendizados mútuos tanto no trabalho dos laboratórios como também no ensino das primeiras letras, noções de álgebra e conhecimentos gerais. Era comum que um colega ajudasse o outro para que pudesse frequentar o ensino noturno.

[Entrevistadora] pelo fato do senhor morar aqui, muitas vezes o senhor quebrava o galho de um colega, não é? [Attilio] De outros, que iam para o colégio. Esse de leishmânia, do Gaspar Viana, estudava à noite. Em períodos que eu não estudava. Quantas peças anatômicas eu tirei para ele. Dentro do fixador, mudando de água, lavagem, quantas! (Attilio Borriello, 1986. Acervo COC/Fiocruz. Fita 2, lado B).

 

 

 

 

Amizades se consolidavam, criando outros laços que extrapolavam o ambiente de trabalho e podiam durar toda uma vida. Ernani de Moura Caldas e Narcizo de Araújo se conheceram no Pavilhão da Peste, onde moravam, dentro do IOC. Tornaram-se concunhados e compadres. Narcizo casou-se com Eurídice França, irmã mais velha de Dulce, esposa de Ernani. Logo após os casamentos, continuaram vizinhos e moravam com suas famílias na mesma rua, no bairro do Encantado.

Família de Ernani de Moura Caldas. Na foto, da esquerda para a direita, no primeiro plano: Narcizo de Araújo e sua esposa, Eurídice França. À direita de Eurídice, Dulce França (esposa de Ernani de Moura Caldas). As crianças são filhas de Narcizo e Eurídice Família de Ernani de Moura Caldas. Na foto, da esquerda para a direita, no primeiro plano: Narcizo de Araújo e sua esposa, Eurídice França. À direita de Eurídice, Dulce França (esposa de Ernani de Moura Caldas). As crianças são filhas de Narcizo e Eurídice. Acervo pessoal de Teresa Trevino. Sem data. Autor desconhecido

O fotógrafo do Instituto, Joaquim Pinto da Silva, mais conhecido como J. Pinto foi o responsável por registrar imagens do Instituto Oswaldo Cruz durante as quatro décadas em que prestou serviços à instituição. Em seu trabalho produziu imagens oficiais das obras de construção, da estrutura arquitetônica, dos laboratórios de alta tecnologia, de cientistas, de pessoas ilustres e do cotidiano de trabalho e dos trabalhadores de Manguinhos. Imprimindo sua autoria, ele também foi capaz de produzir atravessamentos.

O objetivo da fotografia que vem a seguir era dar destaque ao equipamento hidráulico da seção de Meios de Cultura que produzia água destilada, inventado por um dos cientistas de Manguinhos. No entanto, o foco está no fundo da sala, onde, por trás da vidraria estão dois auxiliares. Talvez, no instante de produção desta foto, J. Pinto se questionasse intimamente sobre quem realmente deveria estar em evidência, o aparato tecnológico ou o trabalhador?

Para mais informações sobre a vida de J. Pinto, acesse a página da Brasiliana Fotográfica

Joaquim Dias Paredes, chefe da Seção de Meios de Cultura, no fundo, à esquerda. Acervo Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz. Sem data. Foto: J. Pinto.

Para além do trabalho no IOC, os auxiliares se reuniam para jogar futebol, possuíam hobbies e partilhavam atividades de lazer e de espiritualidade.

Ernani de Moura Caldas e outros colegas fundaram um time de futebol, o Manguinhos Futebol Clube. O clube foi uma iniciativa dos próprios trabalhadores, e não havia participação dos cientistas ou da direção do Instituto. O Manguinhos Futebol Clube tinha pretensões de profissionalização, tanto que possuía até empresário, o sportsman Alberto de Souza. Entre os anos de 1920 e 1921 disputou diversos campeonatos pela série A da 3ª divisão da Liga Metropolitana de Desportos Terrestres, cujo presidente, Celio de Barros, era também presidente honorário do clube. O uniforme Manguinhos F.C. era tricolor e trazia as cores vermelho, preto e branco.

Time do Manguinhos F.C. à direita. À esquerda o time do Coelho Neto Atlético Clube BNDigital. Biblioteca Nacional. Jornal Sports Illustrado, edição n° 26, Rio de Janeiro (Brasil) de 29 de janeiro de 1921.

A Congregação Espírita Oswaldo Cruz, em atividade ainda hoje no bairro de Bonsucesso, foi fundada no dia 25 de março de 1933, por iniciativa de Abílio Lopes de Oliveira , auxiliar de laboratório especialista em anatomia patológica.

A fundação da Congregação aconteceu na casa de Bessa Contizano dos Santos, maquinista do IOC, que morava na Avenida Bruxelas, em Bonsucesso. Nesta data estavam presentes e participaram da criação da entidade, além de Abílio Lopes de Oliveira, e de Bessa Contizano, os seguintes trabalhadores de Manguinhos:

Caetano Ferrara, bombeiro, contratado em 1906; Manoel Joaquim de Souza, foguista, contratado em 1911 e Victor Polidoro, carpinteiro, contratado em 1904. O nome do patrono da congregação, Oswaldo Cruz, foi sugerido no mesmo dia, através de prece e vidência de Abílio Lopes, e foi aprovado por unanimidade pelos demais companheiros presentes, que adotaram como lema uma frase atribuída a Oswaldo Cruz “Não esmorecer para não desmerecer”

O centro veio do Lopes. Ele tinha essa concepção religiosa e fundou o centro, inclusive com pessoas de Manguinhos que tinham a mesma concepção religiosa do espiritismo. E está lá até hoje. É uma sociedade espírita com fins [...] beneficentes.[...] Tem até um mini hospital para os associados. Meu irmão mais novo, o Basílio, foi operado lá porque ele era sócio (Hamlet Aor, 1986. Acervo COC/Fiocruz. Fita 6, lado B).

Imagem da antiga fachada do Centro Espírita Oswaldo Cruz. Imagem da antiga fachada do Centro Espírita Oswaldo Cruz. Bonsucesso, RJ. Acervo documental CEOC. Rio de Janeiro.
Imagem da fachada do Centro Espírita Oswaldo Cruz na década de 1990. Imagem da fachada do Centro Espírita Oswaldo Cruz na década de 1990. Bonsucesso, RJ. Acervo documental CEOC. Rio de Janeiro.

Francisco Gomes, o Chico Trombone, era músico e integrava uma orquestra que não tinha participação de outros trabalhadores de Manguinhos, mas era lá onde realizavam os ensaios e guardavam os instrumentos, escondidos de seus superiores.

Para os auxiliares, essas associações fortaleciam seus laços de amizade e companheirismo. No entanto, não eram muito bem-vistas por seus chefes, que reagiam muitas vezes de forma rude, mesmo quando se tratava de espaços de lazer, o que deixavam evidentes o rigor e a disciplina das relações de trabalho.

 

Tanto assim, que uma vez quis ir ao futebol, ele [Julio Muniz] não queria que eu fosse [...] “Preciso de você, não pode ir ao futebol.” Eu disse: “Dá tempo [...] depois do expediente eu vou [...].” Fiquei zangado. Saí. Ele me cercou: “Não pode ir.” [...] num sábado (José Cunha, 1987. Acervo COC/Fiocruz. Fita 4, lado B).

 

Aí era uma flauta, um saxofone, tinha um pistom – pra época era uma orquestra boa – um trombone (que era eu), um banjo, um tocava bateria. [...] Então nós treinávamos ali. Aí o Costa Lima descobriu o nosso esconderijo, e aí acabou, nós tínhamos que arranjar um outro lugar pra poder exercer. – “Olha, crioulo danado, você anda soprando um instrumento e que traz essa turma pra fazer barulho aí. Se eu pegar esse instrumento, eu vou fazer uma corneta comprida, vou esticar e vou amassar tudo.” E eu escondi o instrumento debaixo de um armário lá, num cantinho. [...] O Costa Lima era o tipo do sujeito... Eu acompanhei ele também até morrer (Francisco Gomes, 1986. Acervo COC/Fiocruz. Fita1, lado B).

Attilio Borriello e José Cunha tinham o costume de jogar damas dentro do laboratório, o que era, obviamente, proibido. Neste caso, os trabalhadores se valiam do fato de chegar mais cedo que os pesquisadores para transgredir as rígidas regras institucionais:

 

Júlio Muniz, chegava nove, nove e meia. Então o Cunha ficava aqui no mármore na sacada! Ô Attílio, [...] E eu descia. [...] quando o ônibus vinha bbrrr, aquele barulho, a gente espiava na janela e [...] Júlio Muniz. Então, guardava. Mas o demônio, esse dia entrou, sem ... o tabuleiro era um papelão rasgado no meio e amarrado com barbante. Então quando o Cunha dobrou [...] as pedras caíram todas pelo chão... [...] Eu também fiquei com aquela cara. E o Cunha também levou um carão do Júlio Muniz.[...] E eu não tive outra saída. Bom, Cunha, depois eu volto [...]. Olhei para trás e tal...[...] O Julio Muniz com a mão assim na cintura [...] soltou aquele palavrão (Attilio Borriello, 1986. Acervo COC/Fiocruz. Fita 4, lado A).

Os dois amigos também protagonizaram uma situação inusitada, envolvendo um dos cientistas de seu laboratório

 

Nós tínhamos trabalhado aquele dia. Sangria de cavalo, meio de cultura, sementeira de leishmania. Eu e Cunha estávamos esgotados, esgotados. E pelo meio do dia ou depois [...] , eu comecei com impropério e o Cunha retribuindo, falando mal de tudo quanto era médico. Eu dizia, o Emmanuel é isto. O Cunha dizia: “Isto é pouco. Ele é o filho disto. Isto é pouco!” E o Júlio Muniz? “O Júlio Muniz é outro não sei quê! E tal”. E soltamos ali das grossas. Aí, tinha um jornal dobrado, naquele laboratório [...] tinha uns armários compridos [...] encostados pelo meio [...] naquele janelão do lado de lá dos fundos. [...] O Cunha disse que fui eu que falei. Eu digo, que foi ele. Ele disse: “Sabe de uma coisa, eles que vão para este lugar e vamos ler jornal”. E fui pra apanhar o Correio da Manhã. Quando eu estendo a mão entre dois armários, eu vejo um indivíduo sentado entre dois armários muito vermelho, parecia um tomate maduro. Era o Emmanuel Dias, de quem nós tínhamos falado mal à beça, sentado, vermelho feito um camarão assado. Aí eu peguei o Cunha e apontei, e saímos na ponta do pé pelo laboratório afora (Attilio Borriello,1986. Acervo COC/Fiocruz. Fita 5, lado A).

Joaquim Venâncio também tinha críticas à personalidade de Adolpho Lutz, que era considerado por muitos uma pessoa de difícil trato. Hugo de Souza Lopes, cientista do Instituto e muito amigo de Joaquim é quem nos conta essa passagem:

 

O Joaquim Venâncio, auxiliar do Lutz, foi um dos maiores amigos que tive. Um dia, ele me pegou na porta, quando eu ia para Goiás e fui perguntar ao Dr. Lutz se ele queria alguma coisa. E o Dr. Lutz me pediu para trazer isso, para trazer aquilo. Ele sempre tinha interesse em tudo, não é? Então, na hora da saída me disse o Joaquim Venâncio: "Está vendo o interesse do velho? Chegou até a lhe oferecer cigarro!" (risos). Achei graça, porque o Dr. Lutz era considerado unha de fome, não é? [...] E o Joaquim Venâncio fazia essa crítica (Hugo de Souza Lopes, 1986.  Acervo COC/Fiocruz. Fita 1, lado B).

O silêncio também podia funcionar como um mecanismo de solidariedade e de cumplicidade.

Era no refeitório, os médicos eram no caramanchão, [...] nós, os inferiores, era do lado. Então nós tínhamos um caneco de alumínio, uma vasilha grande de aço inoxidável, com torneira, tinha um mundo de café, não sei quantos litros. Um português na porta com um saco, dando o pão, mas cada pão, que tinha mais tamanho [...] ia entrando, apanhava o pão, enchia, podia repetir. Era muito miolo, o pão era muito grande, [...] os empregados tratavam logo de fazer sua bolotinha de miolo, e um no outro. [...]. Mas tinha um, [...] fez um miolo que não tinha mais tamanho e mirou lá um indivíduo, era umas mesas compridas, e jogou. Mas aquilo pegou na mesa, subiu e pegou na vidraça, e quebrou o vidro. [...] O Avelino, encarregado da ordem da distribuição do pão [...] veio buscar o zelador [...] “Quem foi? Ninguém fala? Suspensão geral, 8 dias.” Todo mundo calado. Que todo mundo sabia, não é? Pois olha! Ele desistiu da suspensão, porque não ia suspender o Instituto todo, mas ninguém condenou ninguém, e isso tem outros assim (Attilio Borriello, 1986. Acervo COC/Fiocruz. Fita 5, lado B). 

Almoço na casa de chá Hora do almoço. Interior da Casa de Chá. Acervo Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz. Data: 1908. Foto: J. Pinto.

Na década de 1930, os repasses de recursos da União cada vez mais escassos, provocou uma grave crise financeira no IOC que repercutiu no padrão de qualidade das instalações e serviços da instituição. Sem verbas, a direção do Instituto foi restringindo aos poucos a oferta de refeições aos funcionários. A solução encontrada pelos auxiliares que moravam em Manguinhos era pular a janela da cozinha à noite e roubar comida das refeições servidas aos cientistas que ficavam guardadas no refrigerador:

Vamos admitir, um prato tinha cinco fatias de goiabada, daquele prato tirava uma; outro prato tinha oito, tirava duas! Então daqueles pratos todos, a gente fazia o farnel, fazia o lanche e no outro dia o Nogueira não desconfiava.(Attilio Borriello, 1986. Acervo COC/Fiocruz. Fita 5, lado B)

Embora fossem proibidas no Instituto, as discussões e manifestações políticas aconteciam entre os trabalhadores.  

Deus me livre se Miguel Osório de Almeida, por exemplo, tolerasse que um dos auxiliares dele conversasse sobre política dentro do laboratório. Não havia essa conversa; a conversa girava em torno de pesquisa, de ciência, nada de política (Francisco Gomes, 1986. Acervo COC/Fiocruz. Fita 4, lado B).

Apesar disso, há evidências de que os auxiliares não só debatiam sobre política, como participavam ativamente dos acontecimentos históricos da política nacional.

[...] Na Revolução de [19]32. A Revolução Paulista! Eu continuei a favor de São Paulo. Mas, eu não podia [...] interferir. Mas, aqui dentro nós cavamos um mimeógrafo daqueles antigos [...] era uma tinta, um rolinho [...] Primeiro, escrevia à máquina, num papel que furava, não é? Então, a gente passava aquilo e tirava umas cópias. Então, Boletim Revolucionário, no Rio de Janeiro [...] Muitos, muitos, muito boletins foram feitos por mim. Faz favor de desligar (risos)[...] Então, todo mundo ouvia na Mayrink Veiga...[...] Torcida e forjando o boletim (Attilio Borriello, 1986. Acervo COC/Fiocruz. Fita 2, lado A).

 

Aqui em Manguinhos eu não consegui organizar uma célula [do Partido Comunista Brasileiro] porque o pessoal tinha medo. Não era medo do comunismo, era medo da polícia, medo de ser encanado. É lógico. Eles tinham que sustentar família e tudo isso. Eles contribuíam muito reservadamente. Havia uns dez ou doze que compravam o material que eu trazia: jornal, panfleto, livros. E eu levava o dinheiro. Mas nada de dizer nome de ninguém (Hamlet Aor, 1986. Acervo COC/Fiocruz. Fita 2, lado B).